terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Inverno ou Inferno? Só muda uma letra...


A unanimidade é burra. A frase de Nelson Rodrigues é sábia. Por isso, desculpem-me os que gostam, mas eu odeio o inverno. O meu ódio pode até ser atribuído ao fato de eu ter deixado os 40° do Rio de Janeiro, depois de 28 anos, para sobreviver às baixas temperaturas de Curitiba. Mas não é um ódio gratuito. Posso listar alguns motivos que me fazem desejar a total eliminação dessa estação do ano e, antes que me perguntem, não sou a favor do aquecimento global.
Desde os primórdios, o inverno não era associado a coisas positivas. O paraíso, por exemplo, retratado em Gênesis, tem como principais habitantes Adão e Eva. E por acaso algum dos dois está vestido com casaco de lã e cachecol? Claro que não! O paraíso é quente, e a vestimenta deles se resume a uma pequena folha de parreira. Já o inferno é descrito como um lugar quente e cheio de labaredas. Na minha opinião, o inferno era gelado, mas o diabo, não suportando o frio, decidiu fazer uma enorme fogueira e acabou incendiando todo o local.
Os diretores de filmes de terror, por exemplo, têm uma visão negativa do inverno. Ou alguém se lembra de algum filme desse gênero que tenha, como pano de fundo, uma praia ou qualquer cenário colorido característico do verão? Quando o gênero é terror não há escapatória, os filmes estão sempre emoldurados por uma paisagem fria, cinza e escura.
Pensem que de inverno para inferno só muda uma letra. As plantas secam, pessoas morrem de hipotermia, ficam resfriadas; a maioria das atividades tem que ser indoor. Tudo, absolutamente tudo, precisa de um ritual.
Quando me mudei para Curitiba, lembro que meu primeiro martírio foi tomar banho. Transformava o banheiro na abertura do seriado “Além da Imaginação”. Conseguia o efeito da fumaça com o chuveiro ligado no quente máximo. Após essa fase, vinha o banho em si. A água e um lança chamas passavam a ser sinônimos. E quando resolvi seguir o ritual que adotava quando morava no Rio? Banho morno e uma gostosa chuveirada gelada no final. Quando dei essa chuveirada e a água gelada atingiu minha cabeça, tive certeza de que metade das minhas idéias desapareceu do meu cérebro. A água gelada tinha a temperatura equivalente à água que se acumulava na gaveta do congelador.
E como se comportar diante do vaso sanitário? Já que não contamos ainda com a tecnologia japonesa dos assentos aquecidos, a ginástica, pelo menos a que adotei, era primeiro sentar-me sobre as mãos para, aos poucos, ir permitindo o contato da coxa com a tampa. É preciso também desenvolver a capacidade de prever, com pelo menos cinco minutos de antecedência, a vontade de ir ao banheiro, pois tirar toda a roupa pode levar algum tempo. Existe ainda o agravante de que, nessa “maravilhosa” época do ano, transpiramos menos e acabamos urinando mais, sendo maior o número de vezes que temos que visitar o banheiro.
Ainda há os entusiastas do inverno que afirmam, veementemente, ser essa a época do ano em que nos vestimos melhor, ficamos mais elegantes. Vale para quem nasceu em um lugar frio. Mas para quem, como eu, cresceu no Rio de Janeiro, saber se comportar e se movimentar com tanta roupa é quase o mesmo desafio de aprender uma arte marcial. A quantidade de roupa é tão grande que os movimentos mais básicos são travados. Alguém por acaso consegue teclar no computador vestindo uma luva de lã? E o tal do sobretudo? Esse foi o mais traumático para mim. Era praticamente a capa do Batman só que sem seus superpoderes.
Voltando à Curitiba, lembro-me de ter experimentado quase todas as doenças respiratórias. Todas acompanhadas da maldita corisa. Conviver com corisa é quase o equivalente a ser torturada com pequenas e contínuas alfinetadas. A secreção mucosa vai sendo eliminada na velocidade de uma goteira e o nariz vai sendo ininterruptamente esfolado, até você ter a convicção de que prefere arrancá-lo e passar a respirar apenas pela boca. E para sobreviver na cama, na hora de dormir? Lembro-me de ter que passar o ferro no lençol antes de me deitar; do contrário, era a mesma sensação de mergulhar em uma piscina gelada.
Quando já morava em Florianópolis, fui visitar a minha grande amiga Rosa, em Curitiba. Dormi no sofá-cama do seu quarto de hóspedes. Ciente da minha ojeriza pelo frio, ela me cobriu com um edredom, um lençol e um cobertor de lã – todos da sua cama principal que era king-super-mega-ultra-size. Depois que me deitei embaixo de tudo isso, tive um ataque de claustrofobia. Senti que estava em um treinamento para sobrevivência em soterramento. No meio da noite, queria levantar para fazer xixi e não conseguia sair de todo aquele peso. Pensei até em pedir ajuda pelo celular. E qual é a dica para uma pessoa agitada como eu que muda de posição pelo menos vinte vezes antes de pegar no sono, lidar com tamanho peso de cobertas? Até conseguir a posição ideal você se torna praticamente uma toalha retorcida.
Existem ainda aqueles que dizem ser o inverno a melhor estação do ano para namorar. Então porque será que as pessoas, ao invés de fazerem sexo na temperatura real dessa estação, simulam, com o aquecedor, um dia de verão no quarto.
Não adianta, tudo no inverno acaba se tornando negativo. Se você está na praia em um dia de verão e bate uma brisa, é uma bênção. Já no inverno, qualquer sopro de ar nos faz arrepiar dos pés à cabeça. Por que Deus não pensou em conceber um vento quente para o inverno? E as propagandas na TV? No verão, assistimos a um desfile de propagandas com pessoas felizes, cheias de saúde, na praia, tomando cerveja. Já no inverno, inicia-se a maratona dos comerciais relacionados a doenças: é remédio para resfriado, pneumonia, asma, nariz entupido, e por aí vai.
Apesar dos meus argumentos, tenho sempre que lidar com aqueles que querem me convencer que o inverno é bom. Mas, por mais que me tentem provar o contrário, eu odeio o inverno e ponto final. Acostumar-me com ele, nunca. Conformar-me, estou tentando...

12 comentários:

  1. Tati, parabéns!! Chorei de rir! Apesar de não ter este horror pelo inverno, me ví em várias situações narradas por você! Muito bom!! Bj

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  2. Sabe, eu adoro o inverno!!!...

    ... mas até que ri com a sua crônica. (ha ha ha)
    beijos.

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  3. olha, a curitiboca aqui continua sempre esperando por vc, no inverno ou verão.
    rsrsrsrs.
    bjim

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  4. Tati, você tem toda razão!!! Apesar de adorar Curitiba, eu também odeio o inverno, ou melhor, o frio, porque afinal o inverno no Nordeste nem é tão ruim assim! Mas metade do seu sofrimento faz parte de seu lado carioca, com certeza. Você precisa aprender uns truques pra não sofrer tanto assim... tem que morar em Curitiba outros 28 anos, pelo menos...
    Lendo o texto, lembrei direitinho da sua cara e claro das reclamações num dos invernos mais frios de Curitiba e seu primeiro ano por lá!!!

    Parabéns pelos textos!!!! Expressam exatamente sua inteligência, humor e perspicácia!!!

    Bjs e saudades

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  5. Tatiiiiii, A-D-O-R-E-I!!
    Compartilho com você o ódio pelo frio hahahahahaa.
    Não sou carioca, mas como boa sul -matogrossense acho que o calor é TUDO!!

    Beijocas
    Camila

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  6. Acho que temos que arrumar um namorado até o inverno, apesar de amar o inverno sem namorado não dá!

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  7. Menina parabéns me mudei para Curitiba, a dois meses,estou literalmente odiando esse clima e achei sua cronica maravilhosa,estou vindo do Tocantins,imagine o que vou passar neste inverno,já estou de luvas a duas semanas penseentão quando o inverno chegar.Abraços.
    Iolanda Hennrichs
    iolanda.hennrichs@gmail.com

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  8. Ahahahaha! Sensacional! Olha que eu te conheço bastante, mas vc é realmente supreendente! Frio? Tô fora!
    Bjão!!!

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  9. Perfeito. Finalmente mais uma alma que odeia o inverno.

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  10. hahaha

    Vou rir com você hoje no Jô

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  11. Tatiana,
    Minha esposa sempre fala que eu sou casmurro.Eu tenho que te apresentar a ela...acho que ela vai jogar a toalha.Bem, chirei de rir contigo no Jô, mas quando vc falou do parabéns, além de concordar contigo, eu me lembrei que uma vez eu parei literalmente um parabéns no meio...Parabéns pra você nesta data querida.Pàra... parabéns porquê??? hoje eu faço um ano amais... e data querida é o cacete... muitas felicidades e muitos anos de vida já é humor negro... aí depois vem o famigerado ahá uhu... vou comer seu bolo...morrre infeliz...Putz...virei seu fã... Parabéns

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  12. Tatiana, quer se casar comigo?
    Eu mato as baratas, não deixo o piloto falar tão pausadamente(como eu não sei, mas dou um jeito).
    Eze

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